Wednesday, October 06, 2010

Nota Oficial da Comunidade Canção Nova sobre as eleições 2010

Da TV Canção Nova


Cachoeira Paulista, 05 de outubro de 2010

Aos queridos membros da Comunidade Canção Nova

Apresento a todos minha reflexão para este tempo de eleições 2010.

A Canção Nova mantém-se alinhada à catequese da Igreja Católica e à sua doutrina comprometida com o direito à vida e à dignidade humana.

O meu convite é que todos sejamos homens e mulheres de fé e oração. E por que lhes digo isto? Porque estamos em tempo de eleições no Brasil. Precisamos ser fiéis aos valores da Igreja. Nosso chamado é evangelizar.

É preciso ver nos irmãos o que nos une.

A Canção Nova não vê cada candidato por suas bandeiras, mas os acolhe como filhos amados de Deus. Cada fiel deve votar de acordo com suas convicções e com a doutrina social da Igreja.

Para este tempo, peço a cada um oração e silêncio. Acolhamos a todos. Rezemos para que eles possam conhecer a verdade. A Canção Nova não apoia candidatos ou partidos. Acolhe a todos.

Por fim, peço em nome da Canção Nova, perdão por qualquer excesso. Nosso objetivo é promover o amor, nosso carisma maior.

Rezemos pelo nosso país, pela Santa Igreja e pelos candidatos, para que sigam a Verdade que é Cristo Jesus e permaneçam n'Ele.

Com a minha benção,

Monsenhor Jonas Abib
Fundador da Comunidade Canção Nova

Friday, October 01, 2010

Nacionalismo brasileiro e suas raízes históricas (3)

Continuação da edição anterior

Aos que sentem dificuldade em situar o Nacionalismo no campo econômico, julgando falsas as afirmativas de que se apresenta como um escudo ante formas variadas de verdadeira agressão externa, é talvez mais claro o quadro político cujas linhas estão precisamente definidas. Nesse cenário, o Nacionalismo representa o ideal democrático, só esposado pelas classes em ascensão, que necessitam da liberdade como o organismo humano de oxigênio

NELSON WERNECK SODRÉ

Vejamos o terceiro corte, que ocorre com a Revolução Brasileira, isto é, praticamente em nossos dias. O seu processo tem início com a Revolução de 1930. Pouco estudado, até agora, esse episódio característico, que constitui um divisor de períodos históricos, marca, outra vez, a composição entre uma facção da classe dominante de senhores territoriais – representada, no caso, pelo governo de três estados da federação, e a classe média, representada particularmente pela contribuição tenentista. Da parte da classe trabalhadora há uma expectativa simpática. A nova composição, a que se sucederá, outra vez, a luta interna pelo poder e o rompimento consequente, opera-se agora, porém, em condições muito diversas: a classe dominante é menos poderosa, a classe média é mais forte, a classe trabalhadora começa a participar da vida política. Essa composição traduzia as alterações ocorridas no campo econômico, entre a República e a Revolução.

A mais grave, pelas suas implicações imediatas, foi a que afetou o regime da monocultura. O café passara de predominante a absoluto, na balança de comércio externo, tornando-se o eixo da vida nacional. Tudo o que produzíamos era consumido no interior, menos o café, que fornecia os recursos com que nos aparelhávamos. Enquanto dominamos os mercados, tudo correu mais ou menos normalmente, traduzindo-se na euforia a que nos referimos. Nos fins do século XIX e particularmente no início do século XX, o cenário já não era o mesmo, e sucessivas crises surgiram no mercado externo. Tais crises, com o domínio político da classe territorial, correspondiam, sucessivamente, a uma concentração dos lucros e uma distribuição magnânima dos prejuízos – tratava-se, em suma, de socializar as perdas. Essa socialização singularíssima vai provocar a contradição entre a classe territorial e as demais classes.

Mas existe ainda a contradição entre os senhores de terras que produzem café e dependem da exportação e de toda a política econômica, particularmente da tarifa e do câmbio, que regula a exportação, e os que produzem o que se destina ao mercado interno. Esse mercado interno corresponde agora a uma população da ordem de cinquenta milhões, caminhando para setenta milhões em nossos dias, não sendo demais admitir que, no total, o mercado seja representado por vinte a trinta milhões. Trata-se, é bem de ver, de um mercado de importância. E tanto é importante que vem merecendo tratamento especial da parte das forças econômicas externas, que o disputam, e quase sempre o conquistam, em condições também quase sempre onerosas para as forças econômicas internas, cujo crescimento é acelerado.

A pressão externa, que não cessa de avultar, sofre, porém, três pausas pouco intervaladas: a guerra mundial de 1914-1918, a crise de 1929 e a guerra mundial de 1939-1945. Essas três pausas permitem à estrutura nacional de produção dar três saltos e, mais do que isso, altera fundamentalmente a fisionomia econômica do país. Seria impossível analisar em detalhes os efeitos dessas pausas, aqui. Cumpre mencionar, no entanto, que permitiram à capitalização nacional o transitório desafogo em que fortaleceu para enfrentar as pressões inexoráveis que se sucederam a cada uma. Essa capitalização operou-se particularmente pela possibilidade de montar um parque industrial de substituição de importações, com todos os reflexos que tal industrialização espontaneamente acarreta, e pela possibilidade de transferir recursos de um campo para outro, do campo agrícola para o industrial, do campo do café para o do algodão etc. A pausa nas importações, por outro lado, permitia, também espontaneamente, que se acumulassem recursos no exterior. A dilapidação impressionante desses recursos, particularmente depois da Segunda Guerra Mundial, corresponde a um dos erros mais clamorosos já cometidos contra o país – e mostra como a classe dominante não atendia aos interesses do conjunto, mas apenas aos seus próprios interesses.

Se a transformação na economia fora profunda, na fase que decorre entre os antecedentes da Revolução de 1930 e os nossos dias, a transformação social lhe refletira os efeitos com celeridade surpreendente. A classe dominante continuaria a ser representada pelos senhores territoriais, mas já sem condições para manter-se sozinha no poder e, progressivamente, sem condições para orientar a vida nacional segundo os seus exclusivos interesses. O crescimento numérico e o amadurecimento político da classe média foi um fenômeno de importância inequívoca, cujos reflexos logo se fizeram sentir na seriação dos acontecimentos, seguindo as oscilações próprias dessa classe. O fator mais importante, porém, seria o advento de uma classe trabalhadora em que o operário definia nitidamente o seu campo e entrava a participar da vida política com uma força inédita no Brasil. A pressão das forças econômicas externas encontrava resistências ou apoios diferentes e contraditórios nessa estrutura social que traduzia as transformações ocorridas na estrutura econômica interna. A velha associação entre a classe territorial e a metrópole, sucedida pela associação entre a classe territorial e a burguesia européia que liderava a Revolução Industrial, seria substituída pela associação entre aquela classe e as forças econômicas externas que lutavam pelo domínio do mercado nacional. Havia perfeita consonância de interesses entre umas e outras. A referida classe declinara em poder, efetivamente. Mas, na mesma medida que perdia sua própria força, recebia uma ajuda importante do setor da burguesia vinculado ao comércio exterior. Pela função que o comércio exterior exerce, quem o controla adquire o controle do país. Assim, as contradições tornaram-se flagrantes na disputa pelo mecanismo que se refere a mercadorias, mas também, e principalmente, no que se refere ao movimento de capitais.

Este movimento, por sua vez, trazia a contradição para o mercado interno, disputado pelo investimento nacional, enfrentando todas as dificuldades, e pelo investidor estrangeiro, coberto de todas as proteções. A progressiva e inexorável expulsão dos capitais nacionais das áreas de alta rentabilidade agravou profundamente o choque de interesses. De outra parte, a velha regra de socializar os prejuízos encontrava, cada vez mais, resistências tenazes e politicamente organizadas quer na classe média, quer na classe trabalhadora, a que se atirava, de preferência, o ônus de uma continuada espoliação. É curioso que se tenha levantado, nesta fase, o problema da não intervenção do Estado na vida econômica, cobrindo-se algumas de suas intervenções, não combatidas, sob o eufemismo de “ação supletiva”. Qualquer estudante de curso secundário sabe que a intervenção na vida econômica existe desde que o Estado existe.  Não provocou debate e controvérsias enquanto a posse unilateral do poder ocultava o problema, uma vez que o Estado funcionava, na tonalidade de suas manifestações, como instrumento de uma só classe. O que traz a controvérsia a primeiro plano, encoberta, aliás, quase sempre, por abstrações doutrinárias, e não clarifica pela situação concreta, é o fato, novo na vida brasileira, de agora termos no poder, não apenas a classe territorial, mas esta e representações ponderáveis da classe média, daquilo que se convencionou chamar de burguesia nacional. Uma vez que o Estado ora atendia aos interesses antigos, ora aos novos, tornava-se necessário levantar o problema de um Estado neutro, abstrato, subjetivo, que realizasse o milagre de não existir, porque proibido de atuar, todas as vezes em que sua intervenção tende a favorecer ou simplesmente a tolerar as forças novas, agora presentes e mobilizadas em nosso país. Todas essas contradições deveriam provocar reflexo na vida política, agitando-se, sob os mais diversos pretextos. O amadurecimento proporcionado pelo novo cenário em que vivemos, quando as classes definem precisamente os seus campos e mobilizam-se para a defesa dos interesses, intervindo na escolha eleitoral e na composição das forças e na constituição do poder, configura o espetáculo de tomada de consciência a que vamos assistindo. É nesse espetáculo que aparece, como uma singularidade para os desatentos, com profundas razões para os pesquisadores, o problema do Nacionalismo.

Por que Nacionalismo? Porque, agora, são as forças econômicas externas o mais poderoso obstáculo ao nosso desenvolvimento, e os seus aliados internos declinam em resistência, já não tutelam o país. Realizar-se nacionalmente, para um país de passado colonial, com estrutura econômica subordinada a interesses externos, corresponde a uma tarefa em muitos pontos idêntica à que os países europeus realizaram, no alvorecer da Idade Moderna, com a derrota dos remanescentes feudais e o avanço da capitalização. O que, para eles, eram as relações feudais, antepondo-se ao desenvolvimento, é, para nós, tudo o que reflete ainda o passado colonial. O Nacionalismo apresenta-se, assim, como libertação. De seu conteúdo libertador provém o teor apaixonado de que se reveste e que leva os seus opositores a considerá-lo mais como paixão do que como política. Conviria acentuar, no caso, que não existe paixão pelo abstrato, e que o Nacionalismo traduz uma verdade – a verdade do quadro histórico, e a verdade é concreta.

Aos que sentem dificuldade em situar o Nacionalismo no campo econômico, julgando falsas as afirmativas de que se apresenta como um escudo ante formas variadas de verdadeira agressão externa, é talvez mais claro o quadro político cujas linhas estão precisamente definidas. Nesse cenário, o Nacionalismo representa o ideal democrático, só esposado pelas classes em ascensão, que necessitam da liberdade como o organismo humano de oxigênio, que vivem do esclarecimento da opinião, que precisam discutir e colocar de público. Precisam, mais do que tudo, do apoio popular, e só isso revela o caráter democrático, essencial, da posição nacionalista. As forças opostas, muito ao contrário, perderam as condições para a vida ostensiva e exercem variadas e repetidas tentativas de limitação de franquias, de restrições às opiniões, de redução do jogo político às velhas fórmulas da combinação de poucos, das decisões clandestinas, das articulações de cúpula, com um horror característico ao que é popular.

O Nacionalismo aparece, pois, num cenário histórico em que é a saída para uma situação real difícil, cujos sintomas ocorrem na existência cotidiana. Corresponde a um quadro real, a necessidades concretas – não foi inventado, não surge da imaginação de uns poucos, não vive da teoria mas da prática. É uma solução espontânea, e esta aparece como das suas limitações e traduz a dificuldade em assumir formas organizadas de luta política. Organizado, é invencível. O teor de paixão que o acompanha, sinal positivo de sua força e não sintoma de fraqueza, assinala a generalidade e a profundidade de seus efeitos: revela que o Nacionalismo é popular, o que não pode surpreender a ninguém, uma vez que só é nacional o que é popular.

Não procedem as comparações, solenemente apresentadas, como acusatórias, de que o Nacionalismo é historicamente inatual – o colonialismo também o é – e que pode levar ao que levou em outros países, em particular na Alemanha e na Itália, recentemente. Esta claro que o Nacionalismo pode levar a tudo, mas não há qualquer parentesco entre a situação apresentada por um país como o Brasil, de estrutura econômica ainda fortemente eivada de colonialismo, e as nações, como as apontadas, em que a ordem capitalista estava plenamente instalada. E seria simples, aliás, estabelecer as distinções pela comparação fácil: as forças econômicas que ajudaram o nazismo e o fascismo são as mesmas que se opõem, aqui, ao surto nacionalista.

O Nacionalismo surge da necessidade de compor um novo quadro conjugando interesses de classe, reduzindo-os a um denominador comum mínimo, para a luta em defesa do que é nacional em nós. É o imperativo de superar a contradição entre a burguesia nacional e a classe trabalhadora que adota o Nacionalismo como expressão oportuna de uma política. É a compreensão de que só passando a segundo plano, sem negá-la ou obscurece-la, a contradição entre a classe que fornece o trabalho, e que ganha em consciência cada dia que passa, e a classe que necessita realizar-se pela capitalização com os recursos nacionais e seu adequado aproveitamento, poderemos subsistir como nação que apresenta o Nacionalismo como solução natural e lhe dá essa força, essa penetração e esse poder catalisador que a simples observação registra.

Criar todos os obstáculos à composição de um quadro em que se harmonizem as forças interessadas no desenvolvimento nacional, torna-se, assim, a tarefa essencial dos que lutam contra o Nacionalismo, dos que nele vêem a ameaça direta ao que representam, dos que verificam a existência de uma possibilidade para o Brasil superar o que nele existe de colonial, realizando-se como nação. O processo mais simples para dividir as forças cuja tendência natural é a articulação, consiste em estabelecer como fundamental a contradição que as separa, agravando as condições de vida, para levar ao desespero os que trabalham e à angústia os que compõem a gama variada da classe média. Daí os perigos de uma política econômica e financeira que gera as condições de incerteza e propicia as de subversão, e as anomalias de exportar capitais um país faminto de capitais, de criar dificuldades ao aparelhamento das empresas que operam com capitais nacionais, de sistematizar a desesperança dos que têm o direito de esperar tratamento igual, quando não preferencial, pelo simples fato de aqui viverem, investirem e trabalharem.

Ora, que é velho e que é novo, nesta fase? É velho, sem dúvida, o quadro do campo, em que relações semifeudais impedem a ampliação do mercado interno; é velha a política de socializar os prejuízos, reduzindo o poder aquisitivo da massa demográfica ascendente; é velha a orientação de relegar o Estado à inércia; é velho o mercantilismo que se traduz numa curva ascensional em volume e decrescente em valor; é velha uma norma que nos aprisiona nos moldes de fazenda tropical produtora de matéria-prima para industrialização externa; é velho o que nos subordina a razões externas, por legítimas que sejam no exterior; é velha, particularmente, a ideia de que o Brasil só se pode desenvolver com ajuda alheia e, principalmente, com capitais estrangeiros.

E que é novo? Nova é a composição social que inclui uma burguesia capaz de realizar-se como classe e começa a compreender que a sua oportunidade é agora ou nunca, e que apresenta a classe média atenta e ideologicamente receptiva, pela maior parte de seus elementos, ao clamor que se levanta do fundo da história no sentido de que nos organizemos para a tarefa que nos cabe realizar, e uma classe trabalhadora que adquiriu consciência política e se mobiliza, a fim de partilhar do empreendimento nacional, vendo nele a abertura de perspectivas ao seu papel histórico. Novo é, pois, o povo. Nada ocorrerá mais sem a sua participação. Nova é a indústria nacional, superada a etapa de bens de consumo e iniciada a de bens de produção, limitada embora pelo atraso na capacidade aquisitiva do mercado interno e onerada por uma política de obstáculos e de dúvidas. Volta Redonda é o novo que afirma a nossa capacidade de realização sem interferências. Novo, em suma, é o Nacionalismo que corresponde ao que nos impulsiona para a frente e rompe com o que nos entrava e entorpece.

Entre o novo e o velho, a escolha não é difícil. Entre o passado e o futuro, a dúvida não existe. Nós escolhemos o futuro. Não pretendemos “perder o fio da história”.